Nesta época de festas abundam as saudações e os desejos de bom natal e próspero ano novo. É algo que se repete há imenso tempo e que no fundo não quer dizer rigorosamente nada.
Com o advento das mensagens por telemóvel o "bom natal" tão naturalmente dito no final de uma conversa ou a um funcionário de uma loja, ganhou novas e mais abrangentes dimensões, difundindo-se electromagneticamente pelo espaço permitindo que cada vez mais pessoas pensassem que do outro lado há alguém que ainda se lembra delas. Para essas pessoas dirijo-me agora com algo que elas provavelmente já sabem: a maioria das mensagens que recebes são iguais a muitas outras, letra por letra, só a recebeste não porque o emissor se lembrou de ti mas porque estavas, afortunadamente, na sua lista telefónica, a qual ele seleccionou massivamente para destinatário da dita mensagem.
Tudo que acontece nesta época não é exclusivo dela, como aliás nada é exclusivo em lado nenhum, contrariamente ao que se diz. Ora, sabendo que esta falta de intenção nas mensagens de natal abundam por esse ano fora, penso que a melhor atitude que se pode tomar relativamente às expressões de amizade e cumplicidade dos outros é a indiferença. Ninguém diz nada com intenção, ninguém diz o que realmente sente. O que fazem é pegarem em falas cliché e atirarem-nas ao ar em momentos oportunos, ficando eles bem vistos pela sua sensibilidade e bonomia e livrando-se de um momento embaraçoso em que viram as costas e mandam os outros à merda, porque é isso que realmente sentem. Desta forma, com abraços e beijinhos, com os irritantes "gosto de ti" e os "adoro-te" se constroem relações aparentemente fortes mas que têm alicerces na areia, relações de um vácuo sentimental alarmante.
É curioso como as palavras perdem o sentido, como são modeladas artificialmente pela mente calculista de pessoas que, para atingirem propósitos egoístas, atiram, quais guloseimas de baixa qualidade, sentimentalismos para o ar.
Vergonha em vós!
22 de dezembro de 2007
sem título
20 de dezembro de 2007
19 de dezembro de 2007
15 de dezembro de 2007
Merecia ser Rasurado nº 2
Cada vez menos sei se vejo verdade ou encenação,
A ida ao teatro já não custa bilhete!
Caminham pelo palco,
Ostensivos, perfumados,
Muitas vezes sem o que comer,
Outras vezes de barriga vazia. É esta a gente que temos.
Ninguém cuida da realidade,
Ela que sempre cuida de nós,
Pois mais tarde ou mais cedo,
Quer o queiramos ou não,
Lá está ela a denunciar a nossa casta e atirar os adereços ao chão.
Ninguém atenta no que é,
Só no que parece que é.
Toda a gente em correria em busca do mesmo:
Posição. Seja ela verdadeira ou falsa,
Que interessa que seja de areia?
O que os outros vêm, isso sim,
Nem que seja por um dia,
Um instante, um segundo,
Quero que me admirem em todo o meu esplendor,
E que interesso eu? Nada,
Só o que meu esplendor, o lanho que tenho na cara
E os trajes que a custo levo.
Não quero ouvir mais nada,
Para quê? Não quero saber,
Quero parecer, para isso respiro,
Para isso trabalho e a mais não olho,
Só à minha condição.
Quando só, quando sem ninguém me vejo,
Posso finalmente deixar de brilhar,
Tiro os trajes e não sou eu,
Sou outro, caído, tísico e lazarento,
Feio e nojento.
E depois? Nada existe se eles nunca o virem,
Só existe aquilo que eles tocam com os olhos,
Tudo o resto é falso, não interessa.
Assim se vive a vida, dando-lhes o que querem,
Nunca nos dando o que queremos,
Ou melhor, dando-nos aquilo que eles querem que queiramos.
Somos feios para sempre, repugnantes em cada acção,
Se por eles deixamos de ser
O que temos no coração.
8 de dezembro de 2007
Desejo
Merecia ser Rasurado nº 1
Podia ser Verão, com os dias pintados de açafrão.
Desde que à noite se lembrassem de pintar o escuro com luzinhas,
De encher os locais públicos com azevinho e ramos de pinheiro
Eu saberia que era Natal.
Se se esquecessem de o fazer, não fazia mal.
Desde que enchessem os centros comerciais, ruas de comércio
Com compras inúteis e falsas demonstrações de caridade,
Eu também sentiria o Natal, embora não tivesse a certeza que dele se tratava.
Afinal as pessoas são assim quase todo o ano,
A única diferença é a quantidade.
No Natal é tudo em grande:
Amizade
Solidariedade
Fraternidade
Amor
E sobretudo Falsidade. Acho bem.
7 de dezembro de 2007
3 de dezembro de 2007
Números.
O um, como número, é insignificante, no entanto é enorme perante o zero.
O problema dos um é esquecerem-se da sua insignificância.
O problema dos zero é olharem para os números negativos e não se preocuparem em ver para além do um.
2 de dezembro de 2007
Anotação IX
Ninguém entra num relacionamento para fazer o outro feliz. Entram nos relacionamentos porque vêem neles um atalho para a felicidade. E não me venham com tretas sentimentalistas, não passa de conversa feita na qual ninguém acredita porque nunca ninguém pensou nela, limitou-se a repeti-la.
E mais: ninguém fica feliz com a felicidade dos outros. Ou a invejam ou lhes é indiferente.