27 de fevereiro de 2008

Anotação XVIII

A energia gasta na busca de felicidade devia ser utilizada para o conforto na infelicidade.

São duas buscas sem fim, mas a última não traz esperanças impertinentes...

25 de fevereiro de 2008

Merecia ser Rasurado nº 3

P’ra Ti Mundomem.


O som que é mudo para ti,

É dor de morte em espaço meu,

É lanho aberto à força do bisturi

impiedoso do destino.

Sou corpo descarnado As partes por aí,

Em lividez exangue de albino.


A mudez que vês neste som,

Tamanha! – d’Este a’Oeste se via,

É, sem saberes, a protecção

que te torna sol de alegria.

Assim és forte como um verão

Que, distraído em euforia,

Esquece o cinzento – a próxima estação.


E passa o tempo, o som não!

Oiço-o furtivo, vigilante,

Com cuidado de ladrão

que busca numa dormente estante

Consolo triste p’ra contínua rejeição.


E assim medra a solidão,

Como erva selvagem a florir,

Como senhora que sem mão

do Homem (que lhe custa a ouvir),

abre caminho pela escuridão

da terra que te está a cobrir.


E Homem vive a besta da Terra,

Homem vive, dono de tudo,

Dono do mar, dono da serra,

Senhor do conhecimento e do estudo.


Mas que senhor é esse, que sapiente animal?

Que dizendo-se racional nem tem sequer vontade?

Digo-vos eu: é o que se sente divinal

quando os únicos haveres da vida são exterior e vaidade;

E que perturbado pelo torpe barulho social

Não consegue ouvir o doloroso som da verdade!


E doloroso sendo, acho

estoicismo que em mim nunca vi;

Que vale a pena ouvir, seja ele baixo,

O som que é mudo para ti.

24 de fevereiro de 2008

palavras

"Achava absurdo e infame fazer a corte à prima... Mas involuntariamente pensava no delicioso prazer de fazer bater aquele coração que não estava deformado pelo espartilho, e de pôr enfim os seus lábios numa face onde não houvesse pós de arroz... E o que o tentava sobretudo era pensar que poderia percorrer toda a província de Portugal, sem encontrar nem aquela linha de corpo, nem aquela virgindade tocante de alma adormecida... Era uma ocasião que não voltava."

Eça de Queirós, "No Moinho" in Contos

20 de fevereiro de 2008

Competitividade

Compreendo a competitividade humana, percebo a sua importância: sem ela a espécie não seria o que é hoje. Contudo, não descortino a razão pela qual, à semelhança de muitos traços dessa animalidade primária de outras eras mais selvagens, a competitividade cega e irracional não foi deixada de lado. É curioso que, hoje em dia, em que o Homem vive em casas que tocam o céu, construiu asas mais rápidas do que qualquer ave, faz cálculos astronómicos em milionésimos de segundo, continue a ceder a essa sua herança animal tão congénita como a própria necessidade de procriar.
A competitividade, na sua vertente irracional, torna as pessoas ridículas, isto porque a competitividade actual limita-se à cópia ampliada da conquista do vizinho: a preocupação em evoluir, em utilizar o desejo de superar o parceiro para crescer não existe. Existe sim uma enorme exibição de peças, sejam elas físicas ou não, na qual o mais evoluído, o mais proeminente é o que tiver a maior, ou pelo menos, o que assim o aparentar. Mais: a competitividade do Homem que se diz civilizado não fica por aqui; somada à fixação no tamanho, há ainda a necessidade premente de espezinhar, logo que possível, o concorrente mais directo, de eliminar potenciais rivais, de tornar a tarefa tão fácil que se possa, por algum tempo, estagnar a "evolução".

16 de fevereiro de 2008

Anotação XVII

A alegria é um hábito.

15 de fevereiro de 2008

Mulheres

É tocante a influência dos passos de uma mulher: tanta leveza, tanta pureza, tanta calma que emana de passos, à primeira vista, tão comuns como outros quaisquer. Gosto de olha-las, sem desejo, sem pensar sequer, só deleitar as retinas na infinita graça que emanam, na beleza profunda que transportam. Como as amo! O homem não tem que amar o concreto, tem que amar o geral, amar a Mulher, toda ela de luz, de paz; toda ela capaz de matar o mais poderoso tormento com o beijo do olhar manso, com a coberta do abraço terno... Mulher é sinónimo de poder, de beleza, de graça, de tudo!
É o sentido não carnal da mulher que me faz ama-la, a eterna aura de serenidade, de mansidão; a dor de não poder ser imenso para a abraçar em toda a extensão!

José Maria Guerreiro